"Um olhar...uma gesto...uma amizade"
"Era
o meu primeiro dia de aulas após uma repentina mudança na minha vida. Eu, os
meus pais e o meu irmão mudamo-nos para este país em busca de um emprego que
faltava no país em guerra onde vivíamos. Estava um pouco receosa porque não sabia
falar o novo idioma e por ser um pouco diferente dos outros.
O
meu coração batia tão depressa como se estivesse a correr uma maratona. Agarrei
as alças da minha mochila e dirigi-me ao portão da escola. Todos os alunos
começaram a olhar-me de lado e a trocar ideias entre si numa linguagem
incompreensível. Um rapaz mais velho veio ter comigo e, com um sorriso de gozo,
atirou-me ao chão. Apetecia-me gritar, mas não conhecia ninguém. O rapaz foi
ter com os seus amigos que começaram a rir-se de mim.
Uma
professora ajudou-me a levantar. Com gestos, expliquei-lhe que apenas tinha
caído após tropeçar numa pedra. Ela disse que se chamava Sara e eu apontei para
mim e disse o meu nome: Amara. Após as apresentações, conduziu-me a uma sala e
eu sentei-me numa das três cadeiras que lá havia. Começou a ensinar-me palavras
básicas e importantes na nova língua. Uns minutos mais tarde, alguém bateu à
porta e entrou. Reconheci aquela cara de imediato, era o rapaz que me tinha
feito cair. Olhou para mim espantado, sentou-se na cadeira a meu lado pondo-a
um pouco mais afastada de mim. Pelos vistos, o rapaz também era estrangeiro,
mas não de pele negra como eu.
Ficámos
uma hora sentados a aprender vocabulário básico e, nesta aprendizagem, descobri
o nome dele. Ele chamava-se Michael e tinha vindo do Reino Unido. Quando a
lição acabou, a professora Sara levou-me para uma sala, onde estava a minha
futura turma. Procurei uma mesa vazia, mas tinha de me sentar ao lado de
alguém. Senti repugnância em cada olhar dos meus novos colegas. Acho que a
professora Sara percebeu a minha dificuldade
em escolher um lugar, pois conduziu-me para o lado de uma menina que, naquele
momento, desviou todo o seu material para o canto da mesa.
Nas
semanas seguintes, continuaram com a mesma atitude em relação a mim. Agora, não
só o grupo do Michael me fazia mal, como outros grupos da escola. Chegava a
casa tão triste que não fazia os deveres nem estudava para os testes. Ia para a
escola, todos os dias, com medo e desencanto e procurava evitar todos os
colegas. Mesmo escondida, havia sempre alguém que me encontrava e maltratava.
Foi num desses dias que tudo mudou.
Um
grupo de rapazes e raparigas empurrou-me com tal violência que caí desamparada
no chão. Não contentes com o que tinham conseguido, começaram a pontapear-me.
Eu procurei proteger-me, mas pouco consegui. Eles eram muitos… eu, só uma.
Entretanto, deixei de sentir os pontapés e, lentamente, afastei os dedos das
mãos que tinha a cobrir a cabeça. Qual não foi o meu espanto, quando vi o
Michael a afastar o grupo. Ajudou-me a levantar e eu murmurei “obrigada”. De
seguida, entregou-me a carteira onde tinha a minha documentação e regressou ao
seu grupo de amigos.
No
dia seguinte, saí do autocarro e fui diretamente para a sala da professora Sara
a fim de evitar qualquer colega que me pudesse agredir. Quando lá entrei,
sentei-me e a professora começou a dar-me a lição. Mais tarde, chegou o Michael
e a aula continuou de forma agradável. Pela primeira vez, vivenciava alguma
felicidade naquela escola e senti uma motivação extra para aprender. Contudo, a
aula chegava ao fim e tinha de me dirigir para a minha sala onde seria o início
de mais um doloroso dia de aulas.
A
meio da manhã, à hora do intervalo, um grupo de alunos voltou a agredir-me e a
pontapear até que senti uma pancada forte na cabeça e, de repente, ficou tudo
escuro à minha volta. Quando acordei, estava deitada numa maca e o Michael ao
meu lado a olhar para mim com um ar preocupado. Uma funcionária perguntou-me se
me sentia bem e se me doía a cabeça. Como respondi que estava bem, ordenou-nos
que fôssemos para as aulas.
O
Michael deu-me a mão para me ajudar a levantar. Em silêncio, acompanhou-me até
à porta da sala. Aqui perguntou-me se eu estava bem. Acenei afirmativamente com
a cabeça, agradeci e entrei na minha sala. Quando a aula acabou, o Michael
estava lá à minha espera e acompanhou-me o resto do dia.
E
assim foram as semanas seguintes. Aos poucos, integrei-me no grupo do Michael,
que, entretanto, já não ia às aulas da professora Sara, e a minha turma começou
a respeitar-me mais.
Nunca
esquecerei os momentos que vivi quando era excluída e maltratada, apenas por
ser de outra raça e ter outra cor. Felizmente alguém começou a olhar-me de
forma diferente, alguém me deu a mão, alguém me ofereceu a sua companhia e a
sua amizade.
A
pensar na minha experiência e com o apoio da professora Sara, criamos, eu e o
grupo do Michael, o Clube da Diversidade. A ação deste Clube é o de integrar
todos os colegas que venham de novo para a nossa escola, independentemente da
sua raça, cor, etnia, religião, género, deficiência ou condições económicas".
Muitos parabéns, Diana!
Adorei o texto, as ideias que defendes!
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